terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Um ciclo que se encerra


Uma das cenas marcantes na vida é um garotinho que vai ao futebol acompanhado do pai ou da mãe e tenta dar o seu melhor para impressioná-los. Então ele dribla todo mundo e marca um golaço. E lá está o pai olhando orgulhoso e aplaudindo.  Igualmente marcante é quando alguém recebe um diploma e o dedica publicamente ao pai ou à mãe. Cenas assim fazem parte de um ciclo de nossas vidas. Temos alguém para mostrar nossos troféus.  Somos crianças, eternas crianças!
O mais importante ciclo.


A vida e o mundo eram meus campos de futebol e meu querido pai estava sempre lá torcendo ardentemente. Quando me machucava, ele sangrava junto, sofria junto. E quanto eu marcava um gol, lá estava ele também vibrando muito comigo. Eu fiz muitos gols maravilhosos. Tenho muitos ainda a fazer. Estava aprendendo com ele as táticas infalíveis  para ser sempre vitorioso, táticas muito simples, mas difíceis de pôr em prática.

Neste domingo último, eu olhei para a plateia e o torcedor preferido não estava mais lá! Estou atônito e sem chão. Ele não está mais me vendo jogar. Foi tirado de cena, alguém não permitiu que ele entrasse mais no jogo da minha vida. Encerra-se um ciclo em minha vida.


Não tenho mais meu orientador, meu torcedor predileto para vibrar comigo, para gritar, para me aplaudir e para me corrigir sempre que eu precisar. Meu pai se foi. Minha criança interior está chorando muito, está sangrando e não há quem consiga estancar esta dor. Estou pedindo isso ao Pai eterno de todos nós. Mas ainda estou em prantos.  Acabou-se um ciclo mágico em minha vida.  Se hoje me perguntassem o que eu mais quero na vida, minha resposta imediata seria: ter a chance de dar mais um abraço e um beijo no meu velho pai. Jogar conversa fora com ele, ele era politizado. Falávamos muito sobre governo, sobre negócios,  sobre histórias do dia a dia.

Mas isso não é possível, sei disso. Não haverá quem me faça essa pergunta e principalmente quem possa me conceder esse desejo. Contento-me com a última lembrança. No final do ano, Deus me iluminou. Pedi para que trouxessem meu pai do interior para passar o final de ano conosco. E no primeiro dia do ano fui levá-lo até seu o sítio, no interior de São Paulo. Foi uma viagem agradável. Conversamos o tempo todo, quase 3 horas de viagem. Eu partiria para minhas férias no dia seguinte com minha esposa e filho. Tive então o privilégio de viajar com meu paizinho pela última vez. Ao voltar de viagem liguei para ele e combinei de reencontrá-lo para pôr a conversa em dia. Mas não deu tempo! No sábado 21/01 ele morreu sozinho em seu sítio, à noite.

Quem me dera poder dar mais um abraço nele. Conversar uma vez mais. Este momento me remete a escrever e compartilhar com meus amigos, clientes, pessoas que conheço e até mesmo quem não me conhece. O que se pode aprender de algo tão triste, de uma ferida tão significativa. Talvez nada mais que o óbvio que esquecemos e renegamos a todo momento: amar mais as pessoas. Abrace seus entes queridos, beije-os constantemente, ligue, converse, procure, demonstre o seu amor. Aproveite cada final de semana possível, lute para que todos sejam possíveis. Fique junto o quanto puder, porque a qualquer momento esse ciclo se encerrará, isso é certeza. E nesse momento suas boas lembranças valerão ouro e ajudarão a aplacar a dor.

Sabe aquele amigo ou amiga que você não vê há tempos? Ligue para ele ou vá visitá-lo, se realmente você o ama e é importante para você. Há um ano eu quis fazer uma surpresa para uma amiga que mora muito longe da minha cidade. Já não nos falávamos há tempos. Mas eu nunca a esquecera. Como eu estava na região da cidade dela, quis chegar até a sua casa. Bati palmas e alguém atendeu, pedi para chamá-la, mas a pessoa me disse que ela havia morrido de câncer já tinha alguns anos. Fiquei mal por alguns dias. Isso já aconteceu mais de uma vez comigo. E cada vez mais acontece com todos nós.

Temos sentimentos, amamos as pessoas, os amigos, gostamos de reencontrá-los, de saber como estão, de ouvir suas histórias, sua evolução. Mas estamos tão sufocados por obrigações e pela competição da vida, que cada vez temos menos tempo. Nossa mente está cada vez mais cheia de negócios, negócios e negócios. Queremos conquistar, crescer,  ganhar dinheiro, e fazemos isso de maneira indiscriminada, impensada, na maioria das vezes deixando de lado o melhor: observar e curtir cada momento com quem amamos. Ser amado e amar pessoas é uma dádiva à disposição de todos nós, para qual costumeiramente colocamos uma condição: antes de curtir a vida com quem amamos, queremos trabalhar duro e focados para estarmos mais tranquilos e estabilizados, na ilusão de que depois cuidamos dos relacionamentos. É uma grande ilusão.

Pensando hoje, com a ferida aberta, não tenho como chegar a outra conclusão: ficar perto de quem ama sempre em primeiro lugar. Nenhuma conquista tem valor quando você está carregando a alça do caixão da pessoa que você mais ama no mundo.

Forjado nas dificuldades, meu pai se orgulhava de todos os filhos. Cuidou de todos nós com muito esforço e teve a alegria de ver os 12 filhos crescidos e seguros. Eu também tenho muito orgulho dele. Sempre terei como referencial o legado que ele nos deixou: simplicidade, honestidade, lealdade, verdade sempre, amor à família e cuidado pelo nome. Sem mãe desde os 19 anos, a morte do meu pai fecha realmente um ciclo fundamental na minha vida.

Estou reunindo forças para continuar lutando, em memória daquele que hoje eu chamo de meu HERÓI.  Mesmo não o vendo, sentirei sua presença sempre e guardarei seu legado comigo. O jogo continua! Um lugar estará eternamente vago na minha plateia.



Pai, eu te amarei eternamente!

Jairo Robson Soares Brito