Tenho paixão pela vida. Amo pessoas. Sou muito emotivo. Certa vez estava lendo um trecho da história de Gandhi e quando li que ele, já velho, andou descalço por 180 quilômetros marchando com uma multidão por um objetivo comum, saí andando extasiado. Naquele fim de tarde andei por 23 quilômetros e anoiteci em uma rodovia vicinal. Gastei literalmente meus chinelos.
Enquanto caminhava, extasiado, sentia-me feliz, sorria e falava sozinho. No caminho, passei por uma ponte sobre um grande rio. Fiquei por instantes olhando para aquele paraíso, delirando. Aquela paisagem, com sua grandeza e silêncio, me trazia a sensação de estar no quintal de casa. Eu pensava: Deus é meu pai, a terra é sua casa, estou no quintal do meu pai. Foi algo marcante, diferente. Fiz isso influenciado pela história de Gandhi, o homem que amava pessoas.
Gandhi foi um grande homem. Com sua humildade e foco, influenciou e transformou a vida de milhões de pessoas. Mas era um homem comum, como todos nós, um homem que deixou um legado de compromisso com a vida.
A história dele me faz pensar no poder, na forma como o poder seduz os homens e os atrai instintivamente. Gandhi não parece ter buscado poder e nem tê-lo tido formalmente. Esse é o ponto, os homens correm desenfreados atrás do poder, imaginando esse como único caminho para liderar e influenciar pessoas.
Lutar por sonhos, conquistas, riquezas é algo essencialmente salutar. Mas, insaciáveis, queremos mais, nossa sede em muitos momentos é pelo poder, o desejo de dominar, estar por cima, implicitamente para vencer o medo que nos assola. Os medos que tanto nos atingem tornam a vida insossa e bem difícil. Entretanto, ter poder é algo tão fútil como flores murchas, nuvens que se desfazem, rastros que se apagam, não nos faz mais corajosos, apenas nos reveste de uma couraça, admirável, é verdade, mas bem fugaz.
E o poder perverte, pelo menos a maioria das pessoas, porque disfarçado o medo, intensifica-se aquilo que realmente são. Aí vira uma lambança. Pense em quantos políticos, empresários, artistas, ditadores e líderes religiosos conhecemos assim. Pisam em pessoas, traem, maltratam, discriminam e por aí vai, encantados pelo poder, protegidos pela capa fugaz do poder. Salomão disse que a soberba precede a ruína.
Pé no chão! O que nos sobra? Ao invés de pensar em como agir corretamente se tivéssemos grande poder, é melhor aprender a lidar com as pequenas doses que naturalmente temos, por conta das engrenagens da vida: trabalho, família, amigos. Essas doses sim, em boa medida são capazes de nos fazer grandiosos, encarando os medos que consciente e inconscientemente fomos colocando na nossa bagagem, enfrentando-os, vencendo-os, sem a necessidade de nos entregarmos a uma sede desenfreada de poder como sentido para a vida. Assim foi com Gandhi, grandioso pelo compromisso bem resolvido com a vida.
A vida me proporciona experiências tão simples e marcantes, ricas e capazes de me fortalecer e dar sentido à minha caminhada. Viver em família, conviver com o meu filho, levá-lo à escola, tocar com ele, ver filmes, conversar, dormir contando histórias. E quando saio de casa todos os dias, peço a Deus que me ajude a escrever um bom capítulo na história da minha vida. Lembro-me sempre da verdade poderosa: “As pessoas se lembrarão de você pelas experiências que proporcionou a elas”.
Pedra sobre pedra, construção diária de uma história, de um legado. É no cotidiano que pretendo acertar mais, não falhar, olhar para dentro, melhorar, ser verdadeiro e transparente sempre, conviver amistosamente com minhas conquistas, e lutar por elas e por mais, sem abrir mão dos meus valores e sem deixar de enxergar aquilo que pra mim é eterno. Quero proporcionar boas experiências às pessoas à minha volta, quero ser influenciado por elas também. Frank Capra, conhecido diretor de cinema americano, é lembrado principalmente por seu filme “A felicidade não se compra”, em que um homem com a vida arruinada nos negócios é convencido de não cometer suicídio. Um anjo da guarda lhe mostra como sua vida influenciou positivamente as pessoas ao seu redor e que tudo teria tido desfecho diferente, muitos teriam sido infelizes se ele não tivesse existido.
Estou em construção, tenho consciência disso. Todos estamos. Quero ser melhor, consertar meus erros. Pedra sobre pedra, dia após dia, construir um legado com visão, compromisso, humildade, como fez Gandhi.